O problema da dor é que ela não passa. Toda a gente diz que
a dor passa com o tempo, mas é mentira. Nunca passa. Nunca pára. Nunca muda.
Continua sempre. Podemos passar a maioria do nosso tempo a tentar escondê-la, a
tentar ser felizes, mas sabes que mais? Dor é sempre dor, não importa o que
mude. Ela aparece quando menos se espera, como se estivesse guardada numa
pequena caixa e sempre que nos aproximamos demasiado ela simplesmente rebenta.
E nada pode ser feito, nada pode ser mudado. Ninguém te pode oferecer um novo
coração. Ninguém pode mudar o passado. Ninguém pode fazer a dor desaparecer
para sempre. Ninguém a pode matar. Não por ela ser rápida ou forte demais, mas
porque é simplesmente indestrutível. Porque causa marca, abre ferida. Porque
ataca sempre o mesmo lugar, mesmo que ele já não seja tão pobre e indefeso.
Dor. Apenas dor. Uma palavra tão pequena que causa estragos tão grandes, que
marca tanto uma pessoa. E não se nota quando estamos com alguém. É quando
estamos sozinhos que temos de nos preocupar com ela. É aí que temos de lidar
com ela olhos nos olhos, e no entanto saber que ela vai sempre estar um patamar
acima na escada, façamos nós o que façamos. E ela não mata, mas tortura.
Destrói momentaneamente cada pedaço de felicidade algum dia alcançado, arrasa
boas recordações que levamos no coração. E quando volta traz tudo com ela:
lágrimas que ficaram por chorar, palavras que ficaram por dizer, costas que
ficaram por voltar. E faz um peso, um peso enorme, que leva muitas pessoas a
tomar decisões estúpidas e impensadas, irracionais e loucas, que no seu estado
normal não tomariam. Não é nenhuma doença, não é nenhum furacão mental. É
apenas dor. E apenas nesta frase nunca significa apenas, porque nada é pequeno
nela, nada diminui, nada fica mais fácil quando sabemos que ela está lá. Nós
apenas a colocamos numa bolha e a ignoramos, e não queremos encará-la no dia em
que a bolha explode, temendo esse dia como se se tratasse da nossa chegada ao
inferno. A dor é o nosso inferno na Terra, é o necessário para que as coisas
boas aconteçam depois. E as coisas boas não fazem com que a dor desapareça, mas
vão ajudando na formação da bolha, tornando-a menos frágil, mais resistente,
mais duradoura. As coisas boas fazem-nos pensar que somos menos miseráveis, que
somos mais humanos, mais felizes, mais honrados, superiores ao que um dia
fomos. Mas o que um dia fomos continua cá escondido, esperando um dia saltar
para fora. Cabe-nos a nós escolher esse dia, e formar a nossa bolha. Talvez
esse dia não esteja tão próximo ainda. Talvez tudo vá durar. Talvez o brilho do sol seja mais intenso amanhã ao acordar. Talvez tudo pareça menos complicado, menos real, mais sonho e menos preocupante. Talvez. Mas apenas talvez não chega, quando as probabilidades estão sempre contra nós. Nada é certo, tudo pode acontecer. Tudo se transforma, tudo se vê em ângulos diferentes em situações diferentes. Por mim apenas sei que amanhã vou acordar no mesmo lugar, e nem prevejo o que poderei pensar a seguir, porque tudo muda quando fechamos os olhos, quando pausamos o respirar.
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
terça-feira, 4 de dezembro de 2012
Acabei por entender que, nas tuas leves fragilidades,
escondias o que eu procurava. Não te conhecia, e tu não me conhecias. Era passado e futuro, combinado com presente. E eu queria saber quem eras, no entanto, tal coisa era difícil de obter. Não que eu
não pudesse, não que eu não quisesse, mas porque era complicado em si mesmo. E
saberias o que eu queria? O que eu desejava? Desejava passear, caminhar, ver as
estrelas. E era tão difícil não poder, ter de controlar tudo, naquela ânsia de
poder só minha, que tanto abalava os meus sonhos e me fez desistir de tanto, e de
aproveitar tão pouco. E ainda tento não olhar para trás durante o dia, para que a luz
não me leve onde não quero mais ir. Prefiro a escuridão da noite que me traz a
calma e ao mesmo tempo te traz para mim. Sei os passos que não devia ter dado e
dei, sei o que devia ter mudado e não mudei, onde eu devia ter corrigido essas
imperfeições pequenas mas tão grandes e que deixavam marcas gravadas na alma.
Foi difícil ir embora e não olhar para trás, deixar aquela pessoa que eu via no
espelho tantas vezes todas as manhãs e despedir-me dela foi a coisa mais
difícil que algum dia fiz. E valeu a pena. Se eu não tivesse deixado aquela
pessoa naquela manhã, o sofrimento seria ainda maior. E a pessoa que eu deixei
tinha tanto amor dentro dela que talvez não suportasse a desilusão que eu
acabei por trazer a mim mesma, antes de toda a felicidade que veio acrescida
dessa decisão tão complicada de entender pelo meu espírito tão habituado ao
sofrimento e ao passar horas tristes com ele mesmo sem parar de pensar no
antes, no depois e em todas as consequências de todos os actos irreflectidos e
impensados que ocorreram depois daquela manhã. Sei que a pessoa que lá estava
não me teria apoiado nas minhas maiores decisões, decisões essas que levaram a
um novo e gentil amanhecer. A pessoa que lá estava era tão agarrada ao passado
que nem poderia pensar no frio que estava por vir a seguir. Estava tão cega que
nem conseguiria pensar no sol que derreteria esse gelo. Era eu,
independentemente de tudo. Lembro-me tanto daquela manhã porque ela me olhava
como se eu fosse a maior criminosa de todas por lhe ter arrancado aquela luz
idiota que brilhava dentro dela, mas isso era o mínimo que eu poderia fazer
para a salvar. E tenho a certeza que se ela me vir hoje, que me irá agradecer.
Porque naquele espelho ela não está mais sozinha. Ela tem uma das suas maiores
amigas de hoje em dia, alguém que ela conserva dentro de si mesma, no lugar
onde aquela luz tão grande residia, e decerto que amanhã mais um pedaço de vida
se juntará a ela, e juntos farão um pedaço de passado para lembrar alguém de um
presente que não foi vivido mas foi sonhado. E penso que até voltou a fazer
algo que se tinha esquecido de fazer por muito tempo… ela começou a sorrir. Não
pelo ontem, nem pelo amanhã, mas pelo hoje que tinha sido tão delicadamente
trazido por alguém não sonhado mas sentido,e que um dia voltaria a nascer.
E tenho a certeza que mais cedo ou mais tarde o medo dessa pessoa tão esperada vai passar, assim como tanta coisa por ela passou antes de mudar e de se deixar tantas vezes a ela mesma, entregue a sentimentos confusos e tantas vezes opostos, antes de enveredar pela loucura crescente que tanto luzia no seu coração. Vai sobreviver como sempre sobreviveu, levantar-se como sempre se levantou. E vai ser ela mesma, dentro de si mesma, e cada vez que olhar naquele espelho.